quarta-feira, 11 de maio de 2016

Há na memória um rio, onde navegam 
os barcos da infância, em arcadas 
de ramos inquietos que despregam
 sobre as águas as folhas recurvadas.


Há um bater de remos compassado 

No silêncio da lisa madrugada, 
Ondas brancas se afastam para o lado 
Com o rumor da seda amarrotada.


Há um nascer do sol no sítio exacto, 

À hora que mais conta duma vida, 
Um acordar dos olhos e do tacto, 
Um ansiar de sede inextinguida.


Há um retrato de água e de quebranto 

Que do fundo rompeu desta memória, 
E tudo quanto é rio abre no canto 
Que conta do retrato a velha história.

SARAMAGO